PLANO DE CARGO, CARREIRA E SALÁRIO NO CONTEXTO DO SISTEMA ÚNICO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL - SUAS DO PARANÁ - PARTE I

Exercício Ilegal da Profissão, Incoerência entre Cargos e Requisitos
Fonte da Imagem: Sindicato dos Bancários de Santos



Convido o leitor a uma sequência de textos extraídas do meu artigo publicado na revista “Caderno de Gestão Pública” da Uninter (ano 1, n. 1, jul-dez 2012). Neste artigo discuto sobre o Plano de Cargos, Carreira e Salários no Contexto do Sistema Único de Assistência Social – SUAS do Paraná. Minha professora-orientadora foi Fernanda Cagol e tirei 10 na banca avaliadora da pós-graduação, tal feito me rendeu a publicação na revista da universidade. O texto original tem 23 páginas e o leitor ficaria exausto ao chegar na conclusão. Neste primeiro trecho selecionado é possível ir direto para conclusão, após passar pelo resumo e trecho da introdução. Na sequência publico capítulos que fundamentam a conclusão. RESUMO POLÊMICO: NÃO EXISTE CARREIRA NOS PLANOS DE CARREIRA DO SETOR PÚBLICO. Segue debate:


A valorização do trabalhador e a qualificação dos serviços socioassistenciais passa pela discussão de plano de cargos, carreira e salários - PCCS. De um lado as necessidades de desenvolvimento profissional e de reconhecimento postos em recompensas, e do outro a necessidade de manter ambiente produtivo, com foco em resultados e no usuário. São necessidades de uma relação de trabalho, mediada por responsabilidades entre as partes no Plano de Cargos, Carreira e Salários, instrumento que sintetiza os benefícios oferecidos e esperados da organização para com os trabalhadores e vice-versa. A integração do PCCS com outros instrumentos e processos de trabalho da gestão de pessoas, além de sua coerente aplicação prática é que garantirá que este instrumento agregará valor para a organização e para os trabalhadores. Este artigo discutirá PCCS do ponto de vista da gestão por competências, remuneração estratégica e carreira em Y. Trata-se de uma pesquisa bibliográfica e documental. Serão avaliados os PCCS do Estado do Paraná, Londrina e Suzano.

O Plano de Cargos, Carreira e Salários é um importante instrumento de gestão de pessoas que organiza e regula os principais direitos e deveres da relação organização-colaborador. Através dele o trabalhador fica sabendo de suas responsabilidades, de suas possibilidades de desenvolvimento profissional e financeiro. “Para que possa existir ambiente motivador no seio da organização, pessoas integradas e produtivas, são necessários planos adequados de RH. O plano básico, o carro-chefe, é, sem dúvida, o de cargos e salários, porque sem ele dificilmente os demais planos de desenvolvimento funcionam.” (PONTES, 1987, p. 17).

Nas organizações públicas em função de normativas, do peso de gastos com pessoal no orçamento público e pelo fato das mesmas ofertarem aos seus usuários serviços, a gestão de pessoas, ou do trabalho como é concebida no SUAS, se faz de extrema relevância estratégica, o que determinará a qualidade dos serviços e o atingimento de resultados.

Reforçando tal relevância a lei nº 12435 de 06 de julho de 2011 que altera a lei nº 8742 de 07 de dezembro de 1993 (Lei orgânica de assistência social – LOAS) traz em seu art. 6º, inciso V, a gestão do trabalho como eixo estruturante e responsabilidade estratégica dos órgãos gestores da política nas três esferas de governo. É o reconhecimento em lei dos trabalhadores do SUAS como fator crítico de sucesso para a política e seus usuários.

Por outro lado as organizações públicas são carentes de práticas e instrumentos de gestão de pessoas eficientes, eficazes e efetivos. São 49,6% de servidores com vínculo precário (terceirizados, cargos em comissão e CLT) trabalhando nos Centro de Referência em Assistência Social – CRAS (MDS, Censo SUAS, 2010). Soma-se a esta vulnerabilidade a falta de plano de carreira e salários condizentes com o mercado de trabalho, realidade principalmente das pequenas cidades. No Paraná 66% dos órgãos gestores municipais da política de assistência social não possuem PCCS implantados (SETP, Relatório do Monitoramento, 2010).

A rotatividade de pessoas nos CRAS e CREAS do Paraná é alta, prejudicando os serviços prestados nestes equipamentos, que são de natureza continuada e de forte vinculação do servidor com o usuário. Entender a complexidade das relações familiares exige tempo e vínculo de confiança. Neste cenário o plano de cargos, carreira e salários desponta como uma resposta estratégica e urgente, validada pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate a Fome – MDS como próximo ponto de pauta na agenda conjunta entre as 3 esferas de governo.

Os PCCS devem servir ao trabalhador, a organização e aos usuários da política de assistência social. São públicos com necessidades diferentes, mas possíveis de serem harmonizados num único instrumento. As instituições do SUAS precisam de serviços, programas, projetos e benefícios que levam proteção social as famílias e faça com que os indicadores de vulnerabilidades e riscos sociais sejam reduzidos, isto só é possível com trabalhadores comprometidos e competentes.

Estes trabalhadores existem e estão alocados nas instituições públicas e privadas do SUAS no Paraná e no Brasil a espera de líderes e de políticas de recursos humanos que faça desabrochar suas competências e comprometimento.

O desenho de cargos, a trajetória de carreira e sua consequente compensação através de salários presentes no PCCS é a resposta inicial aos trabalhadores do SUAS no Paraná. A partir da implantação com qualidade deste instrumento outras demandas que derivam da relação instituição-servidor deverão ser enfrentadas, caso contrário os PCCS por si só não sustentarão esta relação. No mais os PCCS devem ser revistos com frequência, uma vez que o contexto externo e interno da organização se altera.

Implantar efetivamente a possibilidade de TRAJETÓRIA DE CARREIRA nas instituições do SUAS no Paraná é o maior desafio quanto a gestão de pessoas. Trajetória de carreira alinhada com o desenvolvimento profissional, com as normativas e legislações que cercam a coisa pública. O princípio da livre concorrência posto nos concursos públicos restringe os concursos internos como possibilidade de troca de cargos ao longo da carreira do servidor público. Algumas possibilidades podem ser estudadas:

a) dividir os cargos em níveis de responsabilidade sequencial na linha do tempo, a exemplo Administrador Sênior, Júnior e Master, ou outras nomenclaturas e formatos de enriquecimento de cargo, desde que efetivamente a organização dispõe de trabalho com níveis criteriosamente diferentes para um mesmo cargo;

b) estabelecer carreira gerencial e técnica através dos cargos em comissão exclusivos para servidores de carreira, com critérios claros de seleção e preparação do servidor para assumir tais responsabilidades. Ponto negativo é a transitoriedade dos cargos em comissão que não combina com a característica temporal alongada do desenvolvimento profissional, objetivo da política de carreira.

c) desenhar cargos operacionais, técnicos e gerenciais numa sequência de níveis de responsabilidade e salarial que permita várias trajetórias de carreira, inclusive em y, saindo de um cargo para outro através de concurso interno. Alguns destes cargos em níveis intermediários e avançados poderiam ser exclusivos para concurso interno. É bom lembrar que as especificidades das profissões devem ser respeitadas, ou seja, os concursos internos devem exigir os requisitos do cargo ao futuro pretendente. Esta proposição permite alguém que passou num concurso a muitos anos para atuar como técnico administrativo ocupar cargos de gerência após conclusão de uma faculdade de administração, comprovada suas habilidades gerenciais específicas para o cargo através de processo de certificação ou avaliação de desempenho. Do ponto de vista legal esta proposta precisa de encaminhamentos no legislativo federal.

Outro desafio para os PCCS é a implantação da REMUNERAÇÃO ESTRATÉGICA. Salário alinhado com responsabilidades e resultados. O alinhamento com as responsabilidades se dá na integração progressão de carreira e progressão salarial, é a implantação do desafio discutido nos capítulos anteriores. O alinhamento com os resultados se dá no estabelecimento da remuneração variável, prática já iniciada em algumas prefeituras e governos estaduais, discutida desde o século XIX na administração científica de Taylor. Receber por resultados, por produtos e serviços produzidos, será possível no atual contexto da gestão pública brasileira? Não abriria possibilidades para práticas paternalistas e clientelistas?

Por fim, não menos importante, a estrutura dos PCCS que as instituições do SUAS no Paraná devem adotar tem que ser flexíveis ao contexto e necessidades do ambiente organizacional de cada uma delas e adotar os conceitos de gestão contemporânea discutidas neste artigo. Para ser assertivo o instrumento deve possuir foco no assunto tratado. PCCS que falam de capacitação, avaliação de desempenho, processo de recrutamento e seleção (concursos) não são apenas PCCS; são Políticas de Gestão de Pessoas. Nestes casos como os assuntos são variados a abordagem acaba sendo genérica e superficial, perdendo a qualidade.

Os PCCS devem trazer em anexo os instrumentos meio que permitiram a elaboração dos critérios, formatos e fluxos dos cargos, carreira e salários. Qual método de avaliação de cargos foi utilizado? Houve pesquisa externa de salários? Com base no que foram estabelecidas as responsabilidades e requisitos dos cargos? Existe coerência entre as responsabilidades e os requisitos? Qual a amplitude da curva salarial e por quê? Os instrumentos meio devem responder tais perguntas e não o corpo estrutural do PCCS que deve ser instituído em formato de lei, ou seja, por artigos.

REFERÊNCIAS

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MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL E COMBATE A FOME. Censo SUAS 2010. Brasília, 2011.
ORGANIZAÇÃO DE COOPERAÇÃO E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO – OCDE; MINISTÉRIO DO ORÇAMENTO, PLANEJAMENTO E GESTÃO. Relatório OCDE: Brasil 2010. Brasília, 2010.
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PONTES, B. R. Administração de Cargos e Salários. São Paulo: LTr, 1987.
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